segunda-feira, 22 de outubro de 2012

2012



Para meu espanto, o mundo de fato acabou em 2012, mas não exatamente como pensavam. Fomos morrendo, todos, aos poucos, ao longo do ano, de modo que no dia primeiro de janeiro de 2013 não havia mais humanos na Terra.

Morri em meados do ano e, para minha alegria, não vi meus parentes mais próximos partirem. Os médicos não identificaram a causa da minha morte; até porque, causa não houve; não sabendo do que morrer, simplesmente morri.

E vendo que morta estava, fui em busca da luz branca. Olhei, porém, para um e outro lado, e somente breu consegui ver. E o silêncio era tanto que me doía o ouvido. Será este o céu que guardaram pra mim? De medo, fui encolhendo, encolhendo, até me deitar curvada, como um caracol.

 De repente, comecei a ouvir um som distante, que estava do lado de fora da concha. E tive que me despir. Algo existia além de mim e isso me deixou eufórica, a ponto de me desenrolar e me manter de pé. Queria seguir o som, mas de que lado ele estava?

Aos poucos, o som tornou-se mais alto e claro e pude distinguir diferentes sons, que, para meu azar, vinham de diferentes lugares. Consegui perceber o som de dezenas de instrumentos, como o agogô, a flauta transversa, o pandeiro, o atabaque, o piano, o bandolim, a sanfona, o violino, o "cajón", mas a maior parte dos sons não pude identificar. Mas isso não importava. Estava diante de uma incrível orquestra e sua música era a mais linda e contagiante de todas as que tinha ouvido até então. E comecei a dançar como uma borboleta e voei em direção à orquestra.

No entanto, conforme ia voando, menos sons conseguia ouvir, pois, embora me aproximasse de alguns, afastava-me de outros. E o medo foi voltando e minhas asas começaram a pesar. Queria aquela música do começo, que me trouxe uma emoção e uma segurança nunca antes sentida. E tentei voar para trás, mas o vento não me deixou. Teria que seguir as correntes de ar e elas não corriam no sentido inverso. Mas em qual corrente entraria? De quais sons abriria mão?

O medo da perda e do desconhecido foi pesando minhas asas e não consegui acompanhar corrente alguma. E caí. E novamente me fiz caracol. E de dentro da concha, o som foi se tornando baixo, baixo, até que, num silêncio, escuridão e tristeza profunda, deixei-me quebrar em trilhões de pedaços e, tornando-me pó, dissolvi-me no nada.